terça-feira, 24 de setembro de 2013

Resgatando a agonia dos obscuros, poema de Alvaro Mutis (Reedição)

Basta às vezes um simples poema para descobrirmos a grandeza de um poeta, como o foi Álvaro Mutis. No dia da sua morte, não posso deixar de o celebrar, reeditando um post anterior de 7 de abril de 2013.
LADAINHA
Esta era a ladainha que El Gaviero recitava enquanto se banhava nas águas do delta:
Agonia dos obscuros
recolhe os teus frutos.
Temor dos ancestrais
dissolve a esperança.
Ânsia dos fracos
arrefece os teus ramos.
Água dos mortos
regula o teu leito
sino das minas
modera as tuas vozes.
Orgulho do desejo
esquece os teus dons.
Herança dos fortes
entrega as tuas armas.
Pranto das esquecidas
resgata os teus frutos.
E assim continuava, indefinidamente, enquanto o barulho das  águas afogava a sua voz e a tarde refrescava as suas carnes laceradas pelos mais variados e obscuros labores.



Nota explicativa: o personagem el Gaviero referido no poema é ficcional (tal como Macqrol) e está presente em toda a obra do escritor colombiano Alvaro Mutis. Trata-se de um velho marinheiro, rebelde e visionário, que conta as suas façanhas pelo mundo, em prosa e em verso.  

A escolha deste poema destina-se tão só a concitar a atenção do público para este grande escritor, do qual foi editada recentemente, pela Assírio & Alvim, uma antologia da sua obra poética intitulada Os versos do Navegante, com tradução de Nuno Júdice. 

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