sábado, 16 de novembro de 2013

Um poema de Óssip Mandelstam (1891-1938) contra Stalin


A virulência deste poema de Óssip Mandelstam tem um destinatário: Joseph Stalin. Publicado em 1934, valeu-lhe a prisão às ordens de Stalin, a sua obra foi banida e o seu nome foi pura e simplesmente silenciado. Em 1938, no isolamento de um campo de detenção em Verjoneij, só e faminto, morre aos 47 anos.
O poeta, que no ano a seguir à Revolução Bolchevique (1918) escreve contra “as trevas da liberdade”, intervém desde então na cena cultural e política do seu tempo, pois além de poeta, é ensaísta, crítico literário e tradutor.
Não pode ser considerado um poeta vinculado a nenhuma das linhas políticas em presença na Rússia de então, pois o seu compromisso é com a defesa irrefragável dos valores herdados da tradição clássica e da dignidade do homem: a liberdade, a vida, a criatividade.
O espírito da sua poesia, como a dos seus pares do grupo literário a que se ligou, desde 1911 (Anna Akhmátova e outros), coloca a palavra como lugar de irradiação da verdade, mediante uma conversão à terra. Em clara oposição à estética simbolista, que  usava a palavra como busca do indizivel, Mandelstam e os seus pares fazem-na gravitar em torno da história, do quotidiano, da força animal, criadora do novo  e destruidora do que é velho.
Este poema é eloquente da coragem da coragem deste grande poeta e homem, que soube colocar a verdade e arte acima do medo e da opressão. Um poeta a descobrir!
Como ele, e muitos outros ao longo da história, vencidos embora, veneremos a sua memória tornando-os vencedores!  
Nós vivemos sem perceber o país sob nós,
nossos discursos não são ouvidos a 10 passos de distância,
Mas onde há apenas uma meia-conversa
sempre nos recordamos do montanhês do Kremlin.
Seus grossos dedos são gordos como vermes,
e suas palavras seguras como fios de mundo.
Riem seus bigodes de escaravelho,
e brilham suas polainas.
Rodeia-o um bando de chefetes submissos
E ele se diverte com a servidão dos semi-homens.
Há quem assovia, quem geme, quem choraminga
se somente ele fala ou aponta o dedo.
Como ferraduras ele forja um ukaz após outro
com os quais de um ele ferra a virilha, de outro a testa,
de mais outro as sobrancelhas, de outro
ainda os olhos.
Não há execução que não seja para ele uma festa.”

(Trad. de Luís Mário Gazzaneo)

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