terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Almada Negreiros ou a arte ao serviço do Estado Novo


Almada Negreiros é o autor das gravuras incisas existentes nos três espaços da Cidade Universitária de Lisboa: a Faculdade de Direito, a de e Letras e a Reitoria. Foi uma obra encomendada pelo Estado Novo, datada de 1961. Assim, e para além da qualidade estética das mesmas, há uma clara intenção de nobilitar aqueles espaços do saber e de aí impregnar marcas de exaltação do regime, consagrando a sua soberania transcendente e a exigência de uma obediência absoluta por parte dos súbditos. O regime, após o sobressalto de Delgado e com uma guerra colonial a surgir, precisava de legitimar pela arte a sua autoridade, e o grande Almada Negreiros prestou-lhe esse serviço. Como prova, transcrevo o texto que se encontra no pórtico da Faculdade de Direito, ao fundo do lado esquerdo (para quem entra), retirado da Carta de S. Paulo aos Romanos (13, 1-3):  
omnis anima potestatibus sublimioribus subdita sit: non est enim potestas nisi a Deo quae autem sunt a Deo ordinatae sunt. Itaque qui resistit potestati Dei ordinationi resistit qui autem resistunt ipsi sibi damnationem acquirunt nam principes non sunt timori boni operis sed mali
                                                                                   Ad Romanos, XIII, 1-3
Tradução:
Todo o homem se submeta às autoridades constituídas, pois não há autoridade que não venha de Deus, e as que existem foram estabelecidas por Deus. De modo que aquele que se revolta contra a autoridade, opõem-se à ordem estabelecida por Deus. E os que se opõem  atrairão sobre si a condenação. Os que governam incutem medo quando se pratica o mal, não quando se faz o bem. 
                                                           S. Paulo, Epístola aos Romanos, 13, 1-3

Este texto é emblemático do conjunto da obra de Almada, e aparece no filme Verdes Anos  de Paulo Rocha (1963), usada como referência da opressão política a que estão sujeitos as vidas dos protagonistas (dois  jovens de baixa condição social), onde o amor não acontece e os sonhos de uma vida melhor são uma miragem que a realidade asfixiante do quotidiano calca aos pés. Há sempre alguém, mesmo nos tempos de opressão, que sabe dizer não, e Paulo Rocha pôs-se do lado certo. 
Fachada Principal da Faculdade de Direito de Lisboa

Sem comentários:

Enviar um comentário