Verbiário Volátil
Conjeturas hermenêuticas animadas pelo espírito da utopia.
quarta-feira, 16 de agosto de 2017
terça-feira, 16 de fevereiro de 2016
ENTREVISTA A HEIDEGGER
https://www.youtube.com/watch?v=sCKnbTBzFvk&feature=youtu.be
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quinta-feira, 17 de setembro de 2015
A Autoridade sem coacção do mestre sobre o discípulo, no "Emílio", de Rouseaau
« Qu'il
(l'élève) croie toujours être le maître et que ce soit vous qui le soyez. Il
n'y a point d'assujettissement si parfait que celui qui garde l'apparence de la
liberté; on captive ainsi la volonté même. Le pauvre enfant qui ne sait rien,
qui ne peut rien, qui ne connaît rien, n'est-il pas à votre merci ? Ne
disposez-vous pas, par rapport à lui, de tout ce qui l'environne ? N'êtes-vous
pas le maître de l'affecter comme il vous plait ?... Sans doute, il ne doit
faire que ce qu'il veut, mais il ne doit vouloir que ce que vous voulez qu'il
lasse; il ne doit pas faire un pas que vous ne l'ayez prévu; il ne doit pas
ouvrir la bouche que vous ne sachiez ce qu'il va dire. »
J. J. Rosseau, Emílio, Livro I, p. 250 (edição online http://www.detambel.com/images/30/revue_7224.pdf
sexta-feira, 13 de junho de 2014
O judaísmo sob acusação na prédica de S. António de Lisboa
S. António de Lisboa (ou de Pádua, para os italianos) é santo de
devoção popular não apenas no nosso meio, mas noutros lugares. A
qualidade da sua prosa e do seu pensamento mereceriam outra atenção, não
apenas dos leitores (se houvesse tradução da língua em que escrevia, o
latim medieval) mas também dos estudiosos.
Sobre este aspeto do seu pensamento, profundamente inserido no quadro da mentalidade católica então instituída e do seu modo de interpretar a Escritura (a doutrina dos quatro sentidos), pretendo chamar a atenção para a visão antonina do judaísmo.
No sermão da Ressurreição do Senhor, proferido por volta de 1230, o doutor da igreja parte da citação bíblica “a amendoeira florirá, o gafanhoto engordará e a alcaparra dispersar-se-á” (Eccl. 12, 5), para explicitar os vários sentidos que aí se encerram: o alegórico, o moral e o anagógico.
Quando esclarece o sentido alegórico da expressão (isto é, a ideia universal para a qual a palavra reenvia) da expressão, o tema do judaísmo vem à tona. Nestes termos:
“no gafanhoto é refigurada a igreja primitiva que, com as flores da ressurreição do Senhor, aumenta e enche-se de alegria maravilhosa. (…) Quanto mais a igreja se aumentava tanto mais a sinagoga se desagregava.(…)
“A casa de David é a igreja; a casa de Saúl, que se interpreta “aquele que abusa”, refigura a sinagoga, a qual, tendo abusado dos dons especiais de Deus, recebeu o libelo do repúdio e do abandono e abandonou o tálamo do esposo legítimo.”
Sabemos que este modo de pensar era o padrão dominante, conforme ao que ficou estabelecido no IV Concílio de Latrão (1215), que consagrou uma série de medidas antijudaicas. E este “ovo da serpente” era, afinal, a legitimação ideológica ao processo de ostracização dos judeus que estava em marcha.
Não sei se, no contexto de então, para quem estava tão comprometido com a igreja dominante, era possível pensar de outro modo. Mas sei que a irrupção da consciência de si como indivíduo, capaz de pensar por si próprio sem subordinação às cangas da instituição, ainda estava na latência. E se é assim, tenho muita pena da cegueira imposta a cada um de nós pela nossa condição histórica, que nos turva a lucidez para ver mais longe e mais alto e nos torna coniventes, talvez involuntariamente, dos crimes que alimentam a história.
PS: este ajuste de contas com o Santo estava por fazer, desde há algum tempo! A ocasião agora tem a ver com os festejos antoninos de ontem, em Lisboa. Penso que é necessário ir mais longe e compreender o homem na sua historicidade, no que fez, no que disse, no que escreveu, de modo a ir ao encontro da verdade da sua vida real.
Sobre este aspeto do seu pensamento, profundamente inserido no quadro da mentalidade católica então instituída e do seu modo de interpretar a Escritura (a doutrina dos quatro sentidos), pretendo chamar a atenção para a visão antonina do judaísmo.
No sermão da Ressurreição do Senhor, proferido por volta de 1230, o doutor da igreja parte da citação bíblica “a amendoeira florirá, o gafanhoto engordará e a alcaparra dispersar-se-á” (Eccl. 12, 5), para explicitar os vários sentidos que aí se encerram: o alegórico, o moral e o anagógico.
Quando esclarece o sentido alegórico da expressão (isto é, a ideia universal para a qual a palavra reenvia) da expressão, o tema do judaísmo vem à tona. Nestes termos:
“no gafanhoto é refigurada a igreja primitiva que, com as flores da ressurreição do Senhor, aumenta e enche-se de alegria maravilhosa. (…) Quanto mais a igreja se aumentava tanto mais a sinagoga se desagregava.(…)
“A casa de David é a igreja; a casa de Saúl, que se interpreta “aquele que abusa”, refigura a sinagoga, a qual, tendo abusado dos dons especiais de Deus, recebeu o libelo do repúdio e do abandono e abandonou o tálamo do esposo legítimo.”
Sabemos que este modo de pensar era o padrão dominante, conforme ao que ficou estabelecido no IV Concílio de Latrão (1215), que consagrou uma série de medidas antijudaicas. E este “ovo da serpente” era, afinal, a legitimação ideológica ao processo de ostracização dos judeus que estava em marcha.
Não sei se, no contexto de então, para quem estava tão comprometido com a igreja dominante, era possível pensar de outro modo. Mas sei que a irrupção da consciência de si como indivíduo, capaz de pensar por si próprio sem subordinação às cangas da instituição, ainda estava na latência. E se é assim, tenho muita pena da cegueira imposta a cada um de nós pela nossa condição histórica, que nos turva a lucidez para ver mais longe e mais alto e nos torna coniventes, talvez involuntariamente, dos crimes que alimentam a história.
PS: este ajuste de contas com o Santo estava por fazer, desde há algum tempo! A ocasião agora tem a ver com os festejos antoninos de ontem, em Lisboa. Penso que é necessário ir mais longe e compreender o homem na sua historicidade, no que fez, no que disse, no que escreveu, de modo a ir ao encontro da verdade da sua vida real.
sexta-feira, 6 de junho de 2014
Modelos de democracia: participativo, representativo e deliberativo - Jean-Marc Ferry
Excelente repositório online de filosofia política, da autoria de Jean-Marc Ferry: cursos, artigos, entrevistas, debates, etc.
Pela importância para a nossa atualidade, aconselho a leitura do capítulo "Trois modeles de démocratie" (participativo, representativo e deliberativo), do curso Histoire de la pensée politique, pp. 53-74).
Neste texto, depois de explorar os limites dos modelos participativo e representativo de democracia, o autor especifica o modelo deliberativo nestes termos:
- "o que é decisivo, central, no modelo deliberativo, não é por consequência a expressão da vontade política dos cidadãos, mas a formação desta vontade num processo de discussão pública" (p. 63);
- em seguida, explicita as diferenças do modelo deliberativo relativamente aos outros, por exemplo esta: "em relação ao modelo participativo "puro"(rousseauista), como em relação ao modelo representativo (liberal) o modelo deliberativo recusa a imagem ou a pressuposição de vontades individuais já formadas e completamente preparadas, nos societários., de modo que estes não teriam no fundo nada a aprender de uma conforntação pública com os seus co-societários." (p.63)
A ler por quem quer ter uma opinião qualificada nos debates públicos:
- "o que é decisivo, central, no modelo deliberativo, não é por consequência a expressão da vontade política dos cidadãos, mas a formação desta vontade num processo de discussão pública" (p. 63);
- em seguida, explicita as diferenças do modelo deliberativo relativamente aos outros, por exemplo esta: "em relação ao modelo participativo "puro"(rousseauista), como em relação ao modelo representativo (liberal) o modelo deliberativo recusa a imagem ou a pressuposição de vontades individuais já formadas e completamente preparadas, nos societários., de modo que estes não teriam no fundo nada a aprender de uma conforntação pública com os seus co-societários." (p.63)
A ler por quem quer ter uma opinião qualificada nos debates públicos:
http://users.skynet.be/jean.marc.ferry/Corpus.pdf
http://users.skynet.be/jean.marc.ferry/
quarta-feira, 2 de abril de 2014
Homenagem a Jacques Le Goff com referência ao seu estudo sobre o “mundo dos negócios”
Este extraordinário e inovador medievalista estudou na obra Mercadores e Banqueiros na Idade Média, a génese do sistema económico capitalista, e teve o mérito de mostrar a tese de que o seu surgimento surgiu numa relação de contradição com o sistema dos valores e práticas então dominantes nas sociedades medievais (séc.XI-XIII): o feudalismo e o seu enquadramento ideológico pelo catolicismo.
O tema da usura e do usurário é colocado na obra como o elemento determinante que está na base do capitalismo.
Sobre ela, respigo as seguintes afirmações:
- “A usura é a arrecadação de juros por emprestador nas
operações que não devem dar lugar a juro”;
- “A economia da Idade Média dava-se em termos de dom e contra-dom“;
A única finalidade da troca é estreitar a rede de relações reforçando os laços de reciprocidade”;
- “A usura constituía um pecado contrário à natureza e ao preço justo. Ela visava à frutificação do dinheiro”;
- “Para espanto e escândalo dos medievais descobria-se que o dinheiro trabalhava”;
- “Havia uma relação entre usura e pecado: usura nunca deixa de pecar. Enquanto seu dono dorme, ela não descansa, mas sem parar aumenta e cresce”.
Estas citações permitem concluir que o dinheiro, desviado da sua função natural de instrumento de troca e de unidade de valor, é visto pela Igreja como uma forma iníqua de riqueza, logo condenável, sendo o usurário a figura maligna por excelência, cujo destino no post mortem era o Inferno (onde Dante, na Divina Comédia, os colocou, a par dos sodomitas).
Mas as à medida que a Igreja Católica se foi torna mais permeável re comprometida com os valores terrenos, no séc. XIII, mesmo o pecado da cupidez do usurário é redimível: através da confissão dos pecados, considerada obrigatória para todos pelo menos uma vez por ano (a partir do IV Concílio de Latrão, em 1215) e no post mortem, pela criação do artifício do Purgatório como lugar de expiação dos pecados. E pouco a pouco, o capitalismo pode triunfar e impor-se como dominante.
Certamente que paralelamente a este triunfo, outras transformações profundas da sociedade estavam em curso: a dissolução dos vínculos feudais e a afirmação da liberdade individual; a emergência de uma atitude prática na relação do homem com o mundo; a busca da felicidade sobretudo no horizonte do mundo, pela busca do conhecimento e da ação; por fim a descoberta da finitude radical do ser humano, em todos os planos.
Resta-nos hoje fazer o balanço de todo este processo histórico, nos seus ganhos e perdas. No que ao capitalismo toca, pelos efeitos devastadores que engendra na natureza e nos homens, julgo que temos de inventar uma alternativa. Que não está no passado já feita, mas neste jazem boas sementes (a economia do dom, a teoria do preço justo, a “incrustação” do dinheiro nas práticas sociais) que podem ser reutilizadas.
É essa hoje a nossa tarefa, o capitalismo não é “o fim da história”! Assim como teve um começo, haverá de ter um fim!
domingo, 30 de março de 2014
CANTO FÚNEBRE SEM MÚSICA:um poema de Edna Millay St. Vincent Millay (1892-1950)
Não me conformo em ver baixarem à terra os corações amorosos,
É assim, assim há de ser, pois assim tem sido desde tempos imemoriais:
Partem para a treva os sábios e os encantadores. Coroados
de louros e de lírios, partem; porém não me conformo com isso.
Amantes, pensadores, misturados com a terra!
Unificados com a triste, indistinta poeira.
Um fragmento do que sentíeis, do que sabíeis,
uma fórmula, uma frase resta — porém o melhor se perdeu.
As réplicas vivas, rápidas, o olhar sincero, o riso, o amor
foram-se embora. Foram-se para alimento das rosas. Elegante, ondulosa
é a flor. Perfumada é a flor. Eu sei. Porém não estou de acordo.
Mais preciosa era a luz em vossos olhos do que todas as rosas do mundo.
Vão baixando, baixando, baixando à escuridão do túmulo
suavemente, os belos, os carinhosos, os bons.
Tranquilamente baixam os espirituosos, os engraçados, os valorosos.
Eu sei. Porém não estou de acordo. E não me conformo.
tradução de Carlos Drummond de Andrade
domingo, 2 de fevereiro de 2014
GRÁFICO DO BANCO MUNDIAL SOBRE O CRESCIMENTO DO RENDIMENTO DAS PESSOAS ENTRE 1988-2008
Já sabíamos que "esta globalização mata". Confirma-o este gráfico bem recente do Banco Mundial, que mostra que no período ente as duas Quedas - do Muro de Berlim (1988) e de Wall Street (2008) – assistimos a um aumento exponencial do rendimento de uns, a um aumento precário de outros muito pobres e à queda vertiginosa de outros tantos, os excluídos doas benefícios do crescimento económico.
Concretizando:
1) - um setor de 10% de muitos pobres melhorou o seu rendimento cerca de 40%, mas esse crescimento ficou bloqueado nesse patamar; (cf. barra ao fundo, lado esquerdo do gráfico)
2) - um setor muito amplo (mede-se em milhões) das classes médias dos países ascendentes - sobretudo a China, seguindo-se a Índia, o Brasil, a Indonésia e o Egito – melhorou significativamente o seu rendimento (cf. linha pontuada no seu ponto mais elevado do gráfico);
3) uma elite global de topo que viu o seu rendimento subir em flecha (cf. linha vertical ascendente, do lado direito);
4) – uma classe média tradicional que viu declinar o seu rendimento (cf. à direita, linha descendente;
5) – e um grupo de cerca de 10% da população mundial (metade é constituído pelas populações africanas, e a outra metade por pessoas dos países ex-comunistas e também dos EUA e da Alemanha), que viu o seu rendimento diminuir (cf.na linha dos mais pobres, a cifra -5, entre o percentil 75 e o 85).
Esta situação é descrita nestes termos pelo autor do relatório do Banco Mundial (Branko Milanovic): “o que aconteceu é provavelmente a mais profunda recomposição das posições económicas das pessoas desde a Revolução Industrial”
A liberalização dos mercados é apontada como a causa principal deste estado de coisas, de acordo com Paul Krugman, pois os Estados ficaram privados do seu papel regulador da atividade económica e financeira.
E agora o que fazer? É aqui que reside o buraco da nossa ignorância e da nossa incapacidade de agir em termos concretos eficazes. Mas sabemos que a solução não vem espontaneamente da boa vontade dos que viram o seu rendimento melhorado durante este percurso. E também é difícil imaginar que o setor perdedor tenha condições objetivas e subjetivas para alterar significativamente tanto o seu padrão de vida como infletir mudanças que afetem a dinâmica do sistema global.
Mas em face das enormes dificuldades de mudança do sistema, parece acertado pensar que a alternativa, que é política, só pode vir dos que se encontram na base da pirâmide, com ao apoio dos que., por razões éticas ou outras, se encontram disponíveis para trabalhar numa alternativa, que opere uma mudança na situação da desigualdade na repartição dos rendimentos à escala global.
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