A ópera Orfeu e Eurídice de Gluck (1714-1787), compositor alemão, teve a sua primeira representação em Paris em 1774. A sua construção narrativa foi inovadora, evitando os rebuscamentos anteriores da época barroca: os personagens são reduzidos a três (Orfeu, Eurídice e o deus Amor), o texto é simples e nobre, o coro desempenha a função fundamental em toda a trama e a ação da narrativa começa com Eurídice já morta.
Estes aspetos inovadores trazidos pela reforma da ópera tiveram uma grande repercussão por toda a Europa e desencadearam uma polémica que dividiu conservadores e reformistas. Voltaire pôs-se do lado dos reformistas.
O fragmento da ópera que vos deixo resulta da associação da componente coreográfica com a componente propriamente operática, facto que enriquece o drama de maior simbolismo pela presença dos corpos em movimento fluido e pungente, que evocam a nossa humanidade e mortalidade. Resta acrescentar que a coreografia é de Pina Bausch, foi feita para a Ópera de Paris em 2005, e posteriormente televisionada, em 2008.
Texto:
“(…)
Orfeu – Eurídice!
Coro – Se a tua sombra nos ouve,
sê sensível às nossas lágrimas.
Tem piedade de Orfeu.
Ouve o seu pranto!
Volta para ele!
Orfeu - Eurídice!
Os teus lamentos decuplam a minha dor
Dai a Eurídice as honras supremas.
Cobri o seu túmulo de flores.”
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sexta-feira, 15 de março de 2013
sábado, 5 de janeiro de 2013
Amor absoluto segundo Mallarmé
Rondó II
Se tu quisere’s amar-nos-emos
com os teus lábios sem o dizermos
Mas esta rosa não imterrompas
Pior seria logo o silêncio
Prontos os sonhos que nunca rompem
Sobre o sorriso quando cintila
Se tu quisere’s amar-nos-emos
com os teus lábios sem o dizermos
Mudo se torna tudo em redondo
no purpurado silfo imp´rial
Flamejante o beijo que espedacemos
até à ponta de cada asa
Se tu quisere’s amar-nos-emos
Stéphane Mallarme, “Rondels II”, Poésies, 1913
Cântico do Amor, por Fiama Hasse Pais Brandão
Chagall
Amor é o
olhar total, que nunca pode
ser cantado nos poemas ou na música,
porque é tão-só próprio e bastante,
em si mesmo absoluto táctil,
que me cega, como chuva que cai
na minha cara, de faces nuas,
oferecidas sempre apenas à água.
Fiame Hasse Pais Brandão, Cenas Vivas, Relógio d´Água, 2000
ser cantado nos poemas ou na música,
porque é tão-só próprio e bastante,
em si mesmo absoluto táctil,
que me cega, como chuva que cai
na minha cara, de faces nuas,
oferecidas sempre apenas à água.
Fiame Hasse Pais Brandão, Cenas Vivas, Relógio d´Água, 2000
quinta-feira, 3 de janeiro de 2013
Não posso adiar o amor, António Ramos Rosa
Não posso
adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob as montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas
Não posso adiar este braço
que é uma arma de dois gumes amor e ódio
Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação
Não posso adiar o coração.
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob as montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas
Não posso adiar este braço
que é uma arma de dois gumes amor e ódio
Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação
Não posso adiar o coração.
sexta-feira, 23 de novembro de 2012
Para uma ontologia paradoxal do corpo, por Eduardo Prado Coelho: Parte II
![]() |
Embrace (Lovers II) - Schiele |
A explicitação do
sentido do enunciado foi feita a partir da figura “O corpo do Outro”, que se
inclui no livro de Roland Barthes Fragmentos
de um discurso amoroso. O termo “figura” aqui usada toma o sentido, de
acordo com Barthes, do próprio discurso que o sujeito apaixonado faz, na
primeira pessoa, da sua experiência libidinal (que abrange o plano mental e o
emocional) quando ele se encontra na presença do amado adormecido.
E procedeu à leitura de
excertos da “figura” selecionada de Fragmentos
de um discurso Amoroso:
“O seu corpo estava dividido
– de um lado o próprio corpo – a pele, os olhos –terno caloroso, e do outro,
a voz, breve, moderada, sujeita a momentos de afastamento, (…)”;
“Assalta-me, por
vezes, uma ideia: ponho-me a examinar longamente o corpo amado (…) como se
quisesse ver o que está lá dentro (…) de modo frio e surpreso (…) se o corpo
que examino sai da sua inércia, (…) o meu desejo se modifica; se, por exemplo,
vejo outro pensar, o meu desejo deixa de ser perverso, torna-se imaginário,
regresso à sua Imagem, a um Todo: amo novamente.”
É pelo olhar do corpo (a
pele, os olhos) que se atinge a “superfície”, a “margem de ação”, lexemas
usados por Prado Coelho na sua definição inicial. Em sentido conjuntivo se
devem interpretar estes lexemas.
O corpo é uma “superfície”,
uma pele, algo visível que abre o eu ao mundo como horizonte das suas
possibilidades (Winnicott fala da pele como “membrana do eu” e Didier Anzieu
fala de um “eu-pele”).
Mas é também uma “margem de
ação”: assim como a margem de um rio sofre alterações em função da força do
caudal, a metáfora usada sugere, com pertinência, a condição paradoxal do
corpo: as realizações do corpo (sensoriais, emocionais, discursivas), que
configuram o horizonte das suas significações, reenviam sempre para o desejo.
Mas a natureza inconsciente deste, que excede toda a significação temática,
como um significante flutuante, nunca tem completo preenchimento nas suas
realizações ou nas suas significações conscientes.
Por isso, o desejo aflora à
margem do corpo do outro de vários modos, dirigindo o olhar para zonas de
investimento libidinal, e, num ato de pensamento, quer fazendo-o descer até às
profundezas daquele. Mas, e este ponto é relevante, só quando o corpo do outro
se faz voz, se faz fala, o outro do meu desejo – a minha Imagem – me faz nascer
de novo o amor.
Se é no discurso que apaixonado
diz o seu amor, então a literatura torna-se um espaço próprio em que ele pode
ser enunciado, segundo formas e modos diferenciados.
Toda a literatura nasce
assim dessa ficção maior que é o amor: descrevendo as suas incertezas, os seus
obstáculos, os seus movimentos de aproximação e de separação, as suas
possibilidades ou impossibilidades, a sua morte inevitável ou a sua
transfiguração para além do tempo, a sua capacidade de abrir a porta da
esperança para transformar o mundo, enfim.
Se alguém acreditar no corpo
de Deus, que lhe vem falar ao coração, então também este poderá dizer, sempre
de novo, eu amo-te. Mas esta consequência excede o âmbito do que foi dito na
conferência, é apenas o desejo deste escriba.
Prado Coelho articula assim
o seu comentário sobre esta “figura” de Barthes, colocando-se no mesmo
horizonte de interpretação deste, isto é, a partir da interpretação de Lacan do
pensamento de Freud.
Neste quadro, demarca-se uma
perspetiva do corpo completamente diferente da fenomenológica (que expus na
Parte II deste resumo, em post anterior). Diferenças que levaram certos autores
a procurarem encontrar pontos de complementaridade entre a psicanálise e
a fenomenologia (Merleau-Ponty, Karl Jaspers, Binswanger).
Mas estas tentativas
chegaram a um beco sem saída: a incapacidade da fenomenologia descrever o que
se passa no âmbito das motivações inconscientes obrigou a continua a fragmentar
a compreensão do corpo a partir do dualismo cartesiano da consciência e do
corpo médico. Parece ser difícil encontrar essa “terceira linguagem”, além ou
aquém do dissenso onde ainda nos encontramos.
domingo, 7 de outubro de 2012
La quête de liberté - René Char (1907-1988)
Para estes dias de cólera, é oportuno recordar o poeta da liberdade e do amor ao tempo da Resistência ao nazismo.
"La liberté n’est pas ce qu’on nous montre sous ce nom.
![]() |
Aguarela de Françoise Hennebert |
Quand l’imagination, ni sotte ni vile n’a, la nuit tombée,
qu’une parodie de fête devant elle,
la liberté n’est pas de lui jeter n’importe quoi pour tout infecter.
La liberté protège le silence, la parole et l’amour.
Assombris, elle les ravive ; elle ne les macule pas.
Et la révolte la ressuscite à l’aurore, si longue soit celle-ci à s’accuser.
La liberté, c’est de dire la vérité, avec des précautions terribles,
sur la route où TOUT se trouve."
René Char, Après, 1958, Recherche de la base et du sommet
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