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sexta-feira, 15 de março de 2013

Eurídice e Orfeu: o amor, a música e a dança de Pina Bausch

A ópera Orfeu e Eurídice de Gluck (1714-1787), compositor alemão, teve a sua primeira representação em Paris em 1774. A sua construção narrativa foi inovadora, evitando os rebuscamentos anteriores da época barroca: os personagens são reduzidos a três (Orfeu, Eurídice e o deus Amor), o texto é simples e nobre, o coro desempenha a função fundamental em toda a trama e a ação da narrativa começa com Eurídice já morta.
Estes aspetos inovadores trazidos pela reforma da ópera tiveram uma grande repercussão por toda a Europa e desencadearam uma polémica que dividiu conservadores e reformistas. Voltaire pôs-se do lado dos reformistas.
O fragmento da ópera que vos deixo resulta da associação da componente coreográfica com a componente propriamente operática, facto que enriquece o drama de maior simbolismo pela presença dos corpos em movimento fluido e pungente, que evocam a nossa humanidade e mortalidade. Resta acrescentar que a coreografia é de Pina Bausch, foi feita para a Ópera de Paris em 2005, e posteriormente televisionada, em 2008.


Texto:
“(…)
Orfeu – Eurídice!
Coro – Se a tua sombra nos ouve,
sê sensível às nossas lágrimas.
Tem piedade de Orfeu.
Ouve o seu pranto!
Volta para ele!
Orfeu - Eurídice!
Os teus lamentos decuplam a minha dor
Dai a Eurídice as honras supremas.
Cobri o seu túmulo de flores.”


sábado, 5 de janeiro de 2013

Amor absoluto segundo Mallarmé


Rondó II

Se tu quisere’s amar-nos-emos
com os teus lábios sem o dizermos
Mas esta rosa não imterrompas
Pior seria logo o silêncio

Prontos os sonhos que nunca rompem
Sobre o sorriso quando cintila
Se tu quisere’s amar-nos-emos
com os teus lábios sem o dizermos

Mudo se torna tudo em redondo
no purpurado silfo imp´rial
Flamejante o beijo que espedacemos
até à ponta de cada asa
Se tu quisere’s amar-nos-emos

Stéphane Mallarme, “Rondels II”, Poésies, 1913





Cântico do Amor, por Fiama Hasse Pais Brandão



Marc Chagall, Cântico dos cânticos, V 1965-66
Chagall

Amor é o olhar total, que nunca pode
ser cantado nos poemas ou na música,
porque é tão-só próprio e bastante,
em si mesmo absoluto táctil,
que me cega, como chuva que cai
na minha cara, de faces nuas,
oferecidas sempre apenas à água.

Fiame Hasse Pais Brandão, Cenas Vivas, Relógio d´Água, 2000

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Não posso adiar o amor, António Ramos Rosa



Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob as montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas

Não posso adiar este braço
que é uma arma de dois gumes amor e ódio

Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração.



sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Para uma ontologia paradoxal do corpo, por Eduardo Prado Coelho: Parte II

Embrace (Lovers II) - Schiele
Dando continuidade  ao referido em posts anteriores sobre o tema, Eduardo Prado Coelho começou por definir o “segundo corpo” do seguinte modo: “é o corpo como superfície, como margem de ação”.
 A explicitação do sentido do enunciado foi feita a partir da figura “O corpo do Outro”, que se inclui no livro de Roland Barthes Fragmentos de um discurso amoroso. O termo “figura” aqui usada toma o sentido, de acordo com Barthes, do próprio discurso que o sujeito apaixonado faz, na primeira pessoa, da sua experiência libidinal (que abrange o plano mental e o emocional) quando ele se encontra na presença do amado adormecido.

E procedeu à leitura de excertos da “figura” selecionada de Fragmentos de um discurso Amoroso:

“O seu corpo estava dividido – de um lado o próprio corpo – a pele, os olhos –terno caloroso, e do outro,  a voz, breve, moderada, sujeita a momentos de afastamento, (…)”;

 “Assalta-me, por vezes, uma ideia: ponho-me a examinar longamente o corpo amado (…) como se quisesse ver o que está lá dentro (…) de modo frio e surpreso (…) se o corpo que examino sai da sua inércia, (…) o meu desejo se modifica; se, por exemplo, vejo outro pensar, o meu desejo deixa de ser perverso, torna-se imaginário, regresso à sua Imagem, a um Todo: amo novamente.”

É pelo olhar do corpo (a pele, os olhos) que se atinge a “superfície”, a “margem de ação”, lexemas usados por Prado Coelho na sua definição inicial. Em sentido conjuntivo se devem interpretar estes lexemas.

O corpo é uma “superfície”, uma pele, algo visível que abre o eu ao mundo como horizonte das suas possibilidades (Winnicott fala da pele como “membrana do eu” e Didier Anzieu fala de um “eu-pele”).

Mas é também uma “margem de ação”: assim como a margem de um rio sofre alterações em função da força do caudal, a metáfora usada sugere, com pertinência, a condição paradoxal do corpo: as realizações do corpo (sensoriais, emocionais, discursivas), que configuram o horizonte das suas significações, reenviam sempre para o desejo. Mas a natureza inconsciente deste, que excede toda a significação temática, como um significante flutuante, nunca tem completo preenchimento nas suas realizações ou nas suas significações conscientes.

Por isso, o desejo aflora à margem do corpo do outro de vários modos, dirigindo o olhar para zonas de investimento libidinal, e, num ato de pensamento, quer fazendo-o descer até às profundezas daquele. Mas, e este ponto é relevante, só quando o corpo do outro se faz voz, se faz fala, o outro do meu desejo – a minha Imagem – me faz nascer de novo o amor.

Se é no discurso que apaixonado diz o seu amor, então a literatura torna-se um espaço próprio em que ele pode ser enunciado, segundo formas e modos diferenciados.

Toda a literatura nasce assim dessa ficção maior que é o amor: descrevendo as suas incertezas, os seus obstáculos, os seus movimentos de aproximação e de separação, as suas possibilidades ou impossibilidades, a sua morte inevitável ou a sua transfiguração para além do tempo, a sua capacidade de abrir a porta da esperança para transformar o mundo, enfim.

Se alguém acreditar no corpo de Deus, que lhe vem falar ao coração, então também este poderá dizer, sempre de novo, eu amo-te. Mas esta consequência excede o âmbito do que foi dito na conferência, é apenas o desejo deste escriba.

Prado Coelho articula assim o seu comentário sobre esta “figura” de Barthes, colocando-se no mesmo horizonte de interpretação deste, isto é, a partir da interpretação de Lacan do pensamento de Freud.

Neste quadro, demarca-se uma perspetiva do corpo completamente diferente da fenomenológica (que expus na Parte II deste resumo, em post anterior). Diferenças que levaram certos autores a procurarem encontrar pontos de complementaridade  entre a psicanálise e a fenomenologia (Merleau-Ponty, Karl Jaspers, Binswanger).

Mas estas tentativas chegaram a um beco sem saída: a incapacidade da fenomenologia descrever o que se passa no âmbito das motivações inconscientes obrigou a continua a fragmentar a compreensão do corpo a partir do dualismo cartesiano da consciência e do corpo médico. Parece ser difícil encontrar essa “terceira linguagem”, além ou aquém do dissenso onde ainda nos encontramos.

domingo, 7 de outubro de 2012

La quête de liberté - René Char (1907-1988)

Para estes dias de cólera, é oportuno recordar o poeta da liberdade e do amor ao tempo da Resistência ao nazismo.


 
Aguarela de Françoise Hennebert
 "La liberté n’est pas ce qu’on nous montre sous ce nom. 

Quand l’imagination, ni sotte ni vile n’a, la nuit tombée,
qu’une parodie de fête devant elle,
la liberté n’est pas de lui jeter n’importe quoi pour tout infecter. 

La liberté protège le silence, la parole et l’amour. 

Assombris, elle les ravive ; elle ne les macule pas. 

Et la révolte la ressuscite à l’aurore, si longue soit celle-ci à s’accuser. 

La liberté, c’est de dire la vérité, avec des précautions terribles,
sur la route où TOUT se trouve."

René Char, Après, 1958, Recherche de la base et du sommet