segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Shoah: um verme que rói o mundo, segundo Celan


UMA CANÇÃO NO DESERTO

(...)
EM VÃO desenhas corações na janela: 
o Duque do Silêncio 
arregimenta soldados no pátio do castelo. 
Iça na árvore o seu estandarte - folha que azula quando o outono entra; 
distribui pelo exército as folhas de erva da melancolia e as flores do tempo; 
com pássaros no cabelo parte a enterrar as espadas. 
Em vão desenhas corações na janela: há um deus entre as legiões, 
envolto no manto que um dia te caiu dos ombros sobre as escadas,  de noite, 
um dia, quando em chamas o castelo se erguia, quando falavas
 como falam os homens: Amada...
Ele não conhece o manto e não invocou a estrela e segue aquela folha
ondeando à sua frente. 
"oh, folha de erva", julga ele ouvir, "oh, flor do tempo"

Paul Celan, Papoila e Memória, 1952



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